História
Recontada, ou História Requentada
Quem me conhece bem, sabe que sou fissurado por História,
especialmente História do Brasil.
Entretanto nunca olhei com bons olhos essa Comissão da Verdade.
Primeiro, pois parece-me ser a verdade apenas de um dos lados (nenhum militar
foi convidado para compô-la, por exemplo). A verdade do lado que está atualmente no poder e no
passado participou na guerrilha contra aquele regime.
A despeito dos inegáveis abusos cometidos pelos Militares,
muitos ex-guerrilheiros, com honestidade intelectual, como Fernando Gabeira e
Eduardo Jorge, já declararam que não lutavam pelo restabelecimento do Estado
Democrático de Direito, ou pelo retorno do presidente deposto João Goulart, mas
uma ditadura do proletariado, ao estilo cubano-soviético.
Ademais, por ter um avô que foi socialista, do PSB, preso
naquela ocasião (e durante o Estado Novo, quando então era um jovem estudante
de Direito), parece-me que as esquerdas são bem parciais quando querem contar
um fato, preferindo ressaltar um lado em detrimento do outro. Um exemplo é o
Estado Novo (1937-1945), período autoritário e ditatorial de Getúlio Vargas,
que seguramente, em diversos aspectos, como censura à mídia, perseguição à
oposição (na época dos militares havia um Congresso e uma oposição controlada,
o MDB, que reunia diversos desafetos do Regime; já na época do Vargas, não
havia Congresso nenhum, todos os opositores estavam mortos, presos ou no exílio
e ele governava sozinho). Além disso, a tortura, foi talvez pior que no Regime
Militar (1964-1985).
Recomendo a respeito o excelente livro do lendário jornalista
David Nasser, "Falta Alguém em Nuremberg", sobre a temida polícia do
Vargas, liderada pelo brutal Filinto Müller, cujas técnicas de interrogação
deixava os militares no chinelo. A tortura, portanto, seguramente não começou
quando os militares tomaram o poder, sempre esteve no país, desde a época do
Brasil Colônia (vide como Tiradentes foi morto), nem tampouco foi aplicada
apenas por aquele grupo (se torturou MUITO em regimes stalinistas-soviéticos).
Parece-me que por Vargas, que começou sua carreira como um
ditador fascista, simpático a Mussolini e Hitler, ter passado a Consolidação
das Leis Trabalhistas e ter dado um tiro peito em 1954 para alguns, virou um
santo, herói nacional das esquerdas, a quem bastante perseguiu.
Além de não examinar os dois lados na questão (militares e
guerrilheiros), a CNV parece-me ter sido parcial nas suas conclusões em relação
aos próprios perseguidos durante aquele período, focando suas investigações em
uns em detrimento dos outros, por predileções ideológicas.
Um exemplo claro disso foi em relação aos membros da Frente
Ampla, grupo de ex-políticos cassados, que fizerem oposição àquele Regime.
Para quem não sabe, Carlos Lacerda, o principal líder da direita
no país, jornalista, fundador da Tribuna da Imprensa, e brilhante orador,
reconhecido pelos seus principais inimigos, apesar de apoiar o Golpe Militar de
1964, foi alijado do poder quando os militares tomaram o poder. Lacerda, que
foi deputado federal e governador do Estado da Guanabara de 1960 a 1965, e
virtual candidato pela UDN às eleições presidenciais em 1966, acabou tendo seus
direitos políticos cassados por dez anos.
Juntamente, com seus antigos opositores, os ex-presidentes
Juscelino Kubitschek e João Goulart, elaborou um documento chamado Frente
Ampla, para defender o retorno às eleições e a vida democrática no país, que,
naturalmente, não deu em nada à época, até pela mútua desconfiança que havia
entre esses políticos.
Cerca de dez anos depois, num intervalo de dez meses, todos
morreram. João Goulart (do coração) e Juscelino (de um acidente de carro na
Dutra), em 1976, e Lacerda (de uma infecção no coração), em 1977.
De todas as mortes, seguramente a de Lacerda foi a mais
suspeita.
Jango era cardíaco, fumante e sedentário. Seu próprio biográfo,
que escreveu premiadíssima biografia sobre aquele político, duvida que ele
tenha sido envenenado. Morreu em seu exílio no Uruguai, durante uma noite de
sono.
JK morreu num acidente de carro na Dutra, seguramente uma das
estradas mais perigosas e cheias de caminhões no país (conheço bem aquela
estrada - já dirigi nela diversas vezes, inclusive no trecho que o
ex-presidente faleceu), quando seu motorista perdeu o controle do automóvel e
colidiu com um ônibus.
Para ambos políticos a CNV gastou verdadeira fortuna em
técnicos, perícia, cerimoniais, reportagens, testemunhas, para chegar à
conclusão que não houve conspirações e ele morreram conforme a história
oficial. Não houve envenenamento para Jango, não houve sabotagem no carro de
JK, ou - pasmem - possibilidade de seu motorista ter levado um tiro enquanto
estava dirigindo na Dutra a mais de 100 Km/h (sim, essa possibilidade se
levantou!)
E em relação ao Lacerda? Lacerda seguramente teve a morte mais
suspeita de todos. Foi internado um dia na Clínica São Vicente, no Rio,
com desidratação causada por uma gripe e faleceu no outro, de infecção no
coração (endocardite bacteriana). Tinha 63 anos.
Nunca houve investigação a respeito, apesar de pessoas próximas
à ele afirmarem este ter sido vítima de um complô e que anteriormente à sua
internação era um homem bastante saudável para a sua idade.
Como se pode ver, dois pesos e duas medidas.
Referências:
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