Friday, August 30, 2019

A Experiência do Método Socrático


Por Olavo Franco Caiuby Bernardes, Professor de Direito 
(Publicado no Primeiro Semestre de 2017, na Mostra de Pesquisa em Ciência e Tecnologia 2017 da DeVry Faci)

Relato baseado em experiência própria.
Sempre tive interesse no que constitui a verdade e buscar a verdade dos fatos, não apenas pautar minhas opiniões em impressões pessoais.
Durante o ensino no Brasil, sempre senti interesse em me aprofundar nos assuntos tratados pelos professores, porém muitas vezes senti o método utilizado em sala de aula ser cansativo, pela ênfase de alguns docentes em puramente expor o conteúdo em sala de aula, abrindo pouco espaço para discussão do mesmo.
O filósofo Platão já entendia ser o conhecimento como a crença verdadeira e fundamentada sobre algo (conhecimento – do latim, cognoscere, “saber, conhecer”, com – junto, mais gonoscere, “saber”, derivado do grego gignoskein, “saber”).
Como esclarece Platão, para se buscar o conhecimento devemos nos livrar de nossas impressões e superar o mundo sensível, para atingir o mundo inteligível para ter um real conhecimento dos seres.
A missão do homem seria alcançar as ideias pela sua razão, pelo pensamento reflexivo que abstrai todas as particularidades físicas e sensitivas, uma vez que o inteligível transcende o sensível e as ideias são espirituais.
Desse modo, para Platão, o conhecimento tem que descrever a realidade, o que torna necessária à sua aplicação e comprovação no mundo real como a antecipação de uma realidade futura.
Há diversas maneiras de se atingir, o conhecimento, ou a crença fundamentada sobre algo, sendo que o conhecimento se adquire sobretudo através de um método (do latim, methodus, que significa “caminho”, no caso do conhecimento, caminho para ir em busca de algo).
Entre métodos de ensino, mais ou menos conhecidos, podemos citar o tradicional, construtivista, freireano, comportamentalista, waldorferiano, freiteano, entre outros.
O filósofo e educador norte-americano, John Dewey (1859-1952), patrono de nossa instituição, um dos precursores da Escola Nova, afirmava que o método de ensino precisa ser redimensionado, porque não considerava o pensamento, e que este precisa ser colocado em movimento (LACANALLO et al. , p. 9).
Para o autor, conhecer coisas e as pessoas é o desejo natural de todos os homens. Faz-se necessário um processo de ensino que aproveitasse esse desejo e o ampliasse.
Os métodos deveriam, assim, explorar a curiosidade, as dúvidas e incertezas, a continuidade das idéias, a investigação, a observação e a experimentação (LACANALLO et al. , p. 10).
Para Dewey, raciocinar é algo natural, mas cabe à escola transformar este raciocínio em um exame crítico no qual o espírito do aluno se interesse pelos problemas e se empenhe em buscar formas para solucioná-los de maneira útil. Sendo assim, os materiais precisariam despertar o interesse sem rigidez dogmática, fornecendo informações que permitissem a integração com aquelas que já se possuía num todo coordenado, fazendo parte das experiências do que vem receber aquela informação (LACANALLO et al. , p. 10). Dewey, recorda-se era adepto da escola pragmática de pensamento.
A experiência (do latim experientia, -ae, ensaio, prova, tentativa), como auxiliar ao método de ensino, faz-se extremamente importante na docência.  Alunos tendem a participar mais da aula, quando se põem concretamente na situação tratada em sala, partindo de raciocínios indutivos (exemplo: no meu bairro o poder público e a criminalidade está fora de controle, logo poder público ausente, leva a um aumento da criminalidade), ou seja, experiências pessoais e sensações, para se chegar em uma conclusão maior; ou dedutivos (exemplo “a democracia é o pior de todos os sistemas, com exceção de todos os outros”, Churchill), uma crença genérica sobre algo para observar-se concretamente se esse é o caso no mundo real.    
Nesse sentido, o chamado “método socrático”, largamente adotado em instituições norte-americanas de ensino, sobretudo de Direito, faz-se extremamente relevante para nossa instituição, e amplamente coadunam com as idéias trazidas por Dewey para a docência.
Como professor e aluno de Direito, tendo transitado entre o sistema brasileiro e o sistema norte-americano de educação, sempre me interessou fortemente o chamado "método socrático", baseado nas obras e estudos do filósofo grego, Sócrates (469 - 399. a.C). Sócrates se fez conhecido por desenvolver método dialético no qual interagia com seus interlocutores e tentava extrair destes um raciocínio lógico, baseado nas premissas de suas indagações.
Desse modo, Sócrates buscava maneiras que o indivíduo encontrasse suas próprias respostas, sendo confrontado no percurso em seus preconceitos e visões por demais estreitas da realidade.
Para tanto, Sócrates muitas vezes se utilizava largamente do recurso da ironia. Sócrates, fez-se autor que trouxe pensamento em essência humanista à filosofia (o homem no centro das discussões filosóficas), em contraposição a autores pré-socráticos, divididos pelo grande filósofo pós-socrático, Aristóteles ((384 a.C. – 322 a.C), entre “aqueles que discorrem sobre a natureza”, e “aqueles que discorrem sobre os deuses”.
A "práxis" (modo de ação) socrateana veio a ser denominada "método socrático", e trouxe sérios problemas em vida ao renomado filósofo, que por ser um indagador de diversos valores morais e religiosos então existentes, veio a ser acusado em tribunal composto de cidadãos de Atenas de subverter à ordem social, corromper a juventude e negar os deuses. Condenado, Sócrates foi levado a escolher as seguintes penas: a) a pena de banimento permanente; b) a pena de ter a língua cortada, para que não pudesse pregar mais seus valores, c) ou a pena de morte.
Em suas próprias palavras, Sócrates, aceita então, “o desconhecido”, a pena capital (em oposição ao banimento e ter sua voz calada, algo impensável para aquele pensador), e bebe copo de veneno, conhecido por cicuta, vindo a falecer perante amigos e discípulos aos setenta anos de idade.
Entre seus discípulos, destaca-se, Xenofonte (430 - 355 a.C.), e seu pupilo mais conhecido, Platão (428 - 348 a.C).
Sócrates, que não deixou escritos em vida (o que levou à suspeita de que este fosse um personagem fictício criado por Platão, que o menciona extensamente em diversos escritos, sobretudo em "Apologia de Sócrates"), plantou semente interessante ao método da docência, na própria relação a ser estabelecida entre alunos e mestres.
O método socrático, veio a ser sobreposto pela denominada "Escola Escolástica", ou método tomasiano, por ter sido sumarizada pelo autor medieval São Thomás de Aquino (1225-1274), em sua Summa Theologica, escola esta que se baseia fortemente na dialética (contraposição e contradição de ideias) e na inferência para resolver contradições.
Referido método, adotado durante boa parte em universidades durante o período medieval, pressupõe fortemente a obediência de alunos (do latim 'alumno' - ausência de luz) ao professor/mestre, e forte acatamento ao conhecimento expositivo que este demonstra/expõe em sala de aula.
No entanto, o método socrático vem sendo resgatado, sobretudo no sistema anglo-saxão, a partir do Século XIX. Agora, busca-se um diálogo entre o professor e o aluno, procurando o professor a instigar no aluno um processo de reflexão e descoberta dos seus próprios valores.
O método socrático necessita de grande imersão do discente em estudos, para que chegue preparado à sala de aula, e este venha a debater com o professor o conhecimento adquirido.
Infelizmente, no Brasil, alunos muitas vezes não se preparam previamente à sala de aula para debaterem o conteúdo pré-adquirido e esperam que o professor venha a compartilhá-lo por completo.
Ademais, professores ocasionalmente não têm a humildade de reconhecerem que não possuem todo o conhecimento acerca de determinada disciplina. Portanto, para que o método socrático venha a plenamente funcionar em um país como o Brasil, de tradição civilista, faz-se essencial uma abordagem mais humilde, indagadora e curiosa tanto do docente, quanto do discente, perante o conhecimento.

Fontes (parcial):
Conhecimento para Platão e Aristóteles: Visão dos Filósofos e Teorias.              
LACANALLO, Luciana Figueiredo; SILVA, Sandra Salete de Camargo; OLIVEIRA, Diene Eire de Mello Bortotti; GASPARIN, João Luiz de; TEUYA, Teresa Kazuko. Métodos de Ensino e de Aprendizagem: Uma Análise Histórica e Educacional e Educacional do Trabalho Didático. Sem data. Disponível em: <http://www.histedbr.fe.unicamp.br/acer_histedbr/jornada/jornada7/_GT4%20PDF/M%C9TODOS%20DE%20ENSINO%20E%20DE%20APRENDIZAGEM%20UMA%20AN%C1LISE%20HIST%D3RICA.pdf>. Acesso em maio de 2017.
Resumo Publicado nos Anais da Mostra de Pesqueisa em Ciência e Tecnologia 2017 - https://www.even3.com.br/anais/mpct2017/45982-a-experiencia-do-metodo-socratico/