Como muitos me senti entristecido pela decisão do Supremo Tribunal Federal (STF/ Supremo/ Corte Maior) em adiar a aplicação da Ficha Limpa para 2012. Minha primeira reação, como brasileiro, foi sentir que a decisão atendia interesses mais políticos, do que de justiça e que poderia apenas ser explicada por “interesses escusos”
Afinal uma lei que permitiria que figurinhas carimbadas da política – cujo nome não vale a pena repetir – com condenações em segunda instância – o que na minha interpretação seria suficiente para presumir-se a culpabildade e dar-se início ao cumprimento da pena (visto o princípio do duplo grau de jurisdição) – a não se candidatarem, apenas poderia ser bem-vinda.
Ao adiar a aplicação da lei para 2012, o STF criou uma brecha perigosa e corre-se o risco de termos mais do mesmo nessa legislatura que começou em 2011. O Congresso Nacional (e Assembléias Legislativas) que pareciam mais limpos – com tristes exceções – serão novamente inundado por políticos corruptos de toda estirpe (os que os haviam substituído perderão seu mandato voltando à sua condição de suplentes). O mais perigoso, além da volta dos mesmos, da mesma robalheira, cinismo e canalhice de sempre, é a possibilidade da lei ser revogada no futuro próximo por candidatos antes barrados, que agoram se beneficiam de sua não aplicação (isso, naturalmente, se eles formarem quórum suficiente), ou mesmo da lei ser declarada inconstuticional em sua essência pelo Supremo (não acredito que eles fariam isso, mas hoje em dia a gente não dúvida de nada).
Entretanto a decisão de nossa corte maior, que diga-se de passagem se dividiu completamente também traz um certa segurança jurídico (o caso antes em 5 votos a favor da aplicação da lei para as eleições de 2010, contra 5 votos contra, terminou em 6 votos contra a aplicação para 2010 e 5 votos a favor, com a entrada no novo Ministro Luiz Fux). O voto de minerva na questão, Ministro Luiz Fux, não é nenhum inexperiente e sim um jurista preparado, extremamente capaz e reconhecido, que inclusive fez parte da comissão responsável pela elaboração do projeto do novo Código de Processo Civil.
O artigo 16 da Constituição Federal preve que “[a] lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”. Esse artigo trazido pela Emenda Constitutional de 1993, prevendo o princípio da anteoridade, – portanto vários anos antes da Ficha Limpa, que não era nem um projeto na cabeça das pessoas – visa dar maior segurança jurídica ao processo eleitoral e impedir mudanças abuptras no jogo democrático.
Pode parecer uma tecnicalidade inútil, uma justificativa suspeita para agir-se contra uma lei de forte apoio popular e de grandes órgãos da mídia. Infelizmente não é. A regra do Direito não admite excepção e a segurança jurídica se faz necessária ao sistema brasileiro. Torna-o mais previsível e confiável. A Lei Complementar nº 135 (Lei Ficha Limpa) foi aprovada em junho de 2010, sendo as eleições em outubro do mesmo ano. Portanto o período de um ano não se transcorreu.
Agir contra um artigo expresso da constituição é negar o sistema. Muitos irão argumentar que há leis, decisões judiciais e decretos executivos e legislativos que vão contra a constituição todo santo dia. De fato eles existem. Entretanto,quando o fazem, fazem em relação a artigos constitucionais que implicam idéias vagas, diretrizes e princípios norteadores (como o princípio da moralidade na administração pública, por exemplo).
Entretanto, um artigo constitucional que expresse uma idéia clara é prontamente aplicável – como por exemplo o artigo 37, III, da Constituição Federal, ao prever o prazo de validade de dois anos para concursos públicos – e não gera muito espaço para interpretações.
Essas previsões geram uma certeza no sistema e nos fazem crer que o sistema é mais confiável para bem ou para o mal. Entretanto, devido ao altíssimo nível de corrupção no Brasil, a sensação que fica é de impunidade, de conchavo, de camaradismo...
Se fosse ministro teria muita dúvida em como votar nessa questão: ir a favor de dispositivo expresso da Constituição – que apesar de imperfeita é a única que temos e é a lei suprema da nação –, ou votar com suas convições e apoiar uma decisão que no sentido estrito do termo é inconstitucional, mas justificável – o que é supostamente é proibido ao juiz fazer, pois deve votar de acordo com a lei, não suas convicções.
No final, o que demonstra mais uma vez a decisão de nosso Supremo Tribunal é que cabe à aquela corte decidir o que é constitucional, ou não, ainda que haja uma situação onde algo é claramente inconstitucional, ou claramente constitucional.